Estudos do Design #1 - O Jardim-de-Infância e os Presentes e Ocupações de Froebel na Educação Infantil


        O alemão Frederich Fröebel (21 de abril de 1782 – 21 de junho de 1852) –filósofo, educador, pedagogo e precursor da psicologia – em meados do século XIX, ganhou seu lugar de destaque na pedagogia através de sua teoria – inspirada nos ideais de Pestalozzi, um dos pioneiros da psicologia moderna que teve enorme contribuição na mesma –, que considerava a fase infantil de extrema importância para a formação de um indivíduo. E estava correto em todas as maneiras, pois a fase da infância é a fase na qual temos todos os primeiros contatos, é quando começamos a formar nossos pensamentos, nossos gostos, nossas opiniões, nossas capacidades. Trabalhar o desenvolvimento intelectual e motor de uma criança é mais do que importante, é imprescindível.




        Muitos dos métodos de ensino de hoje têm suas origens nos métodos deste educador. Fröebel procurava incitar a autoeducação e o auto aperfeiçoamento em seus alunos. Ele elaborava sua metodologia de ensino, não baseada em livros de pedagogia, mas sim em suas infelizes experiências de educação na infância – as quais esperava que seus discentes não fossem sujeitos –, e nos ideais inspirados no amor à criança e à natureza, com isso em 1837, ele fundou o primeiro Jardim de Infância (Kidergarten, em alemão, kind significa criança e garten significa jardim) – destinado a crianças menores de 6 anos –, no qual, os alunos eram tidos como pequenas sementinhas de um jardim, que quando colocadas em um ambiente benéfico, desabrochariam em plantinhas. Os professores seriam, portanto, seus jardineiros. 



"A pedagogia da infância de Fröebel, coerente com sua filosofia, pressupões a criança como ser criativo e propõe a educação pela auto atividade e pelo jogo, segundo a lei fundamental do desenvolvimento humano: a lei das conexões internas. Ao inserir suas ideias em uma instituição, criou o jardim-de-infância (Kidergarten), como a livre república da infância. (HUDGES, 1925)."


        O nome da escola vem do fato deste pedagogo ter o ideal filosófico de que a infância deveria ser tratada e observada com todo o cuidado, assim como plantinhas em um jardim. Tais plantas não crescem de maneira aleatória, elas devem ser regadas, ter um solo propício a seu crescimento, e ter a luz do sol na medida certa, assim crescerão bonitas e saudáveis. E todo esse cuidado e observação deve ser executado pelo (a) jardineiro (a). O jardineiro (a) ideal seria aquele (a) que saberia “escutar” a planta, saberia suas necessidades (pois as plantas são diferentes), e saberia que mesmo que aquela planta tenha que passar por todo esse cuidado e atenção, seu crescimento é um processo natural. Fröebel não nomeou sua instituição de “escola” pois esta denominação traria a ideia de que lá se colocariam “ensinamento prontos” dentro da cabeça da criança, e isto se diferia totalmente do objetivo desta instituição, que seria guiar e orientar a criança para que esta se desenvolvesse a sua maneira. 


        Dentre as dinâmicas desenvolvidas no Jardim-de-Infância existiam: colagens, pinturas, canto, jogos, modelagem, palestras, ouvir história, observar imagens, dentre outras. Suas técnicas de ensino eram baseadas na prática, pois ele defendia que o ensino não deveria ser feito por obrigações, mas sim através dos interesses de cada um e da prática. Em sua concepção as brincadeiras não eram tidas apenas como diversão, mas sim como um recurso de aprendizagem, por esta razão o objetivo das atividades nos Jardins-de-Infância era possibilitar brincadeiras criativas. Para ele, as atividades espontâneas possuiam um aprendizado mais verdadeiro do que quaisquer outras, pois a recepção de novos conhecimentos é maior a medida em que a mente da criança é ativada. Ele foi o primeiro educador a colocar os brinquedos como tarefas de educação, visto que, segundo ele, as atividades motoras e os sentidos tinham grande importância na fase da infância. 

        Diante de toda essa preocupação de Fröebel com as atividades criativas para uma melhor evolução do intelecto da criança, ele – após observar crianças de várias idades – criou um material pedagógico bastante propício para o desenvolvimento dos potenciais infantis, os chamados Presentes e Ocupações. Estes eram “um conjunto de blocos geométricos (Presentes) e atividades artesanais básicas (Ocupações) que se tornaria a peça central de sua teoria pedagógica” (MILLER; LUPTON, 2009, p. 14). 



"Por meio de brinquedos que desenvolveu depois de analisar crianças de diferentes idades, Fröebel previu uma educação que ao mesmo tempo permite o treino de habilidades que elas já possuem e o surgimento de novas. Dessa forma seria possível aos alunos exteriorizar seu mundo interno e interiorizar as novidades vindas de fora – um dos fundamentos do aprendizado, segundo o pensador." (FERRARI, 2008.)


        Os Presentes e Ocupações eram constituídos de vários sólidos geométricos, imagens coloridas e trabalhos manuais que estimulavam o lado sensório motor da criança (desenho, colagem, recorte, pintura, bordados etc.). Este material era introduzido em uma sequência altamente ordenada, “que iniciava no segundo mês da criança e era concluída no último ano do Jardim de Infância, aos seis anos de idade. [...] A sequência pretendia espelhar o desenvolvimento físico e mental da criança.” (MILLER; LUPTON, 2009, p. 14). 


        Os Presentes (ou Dons) foram assim nomeados pois seriam como "presentes" dados às crianças, instrumentos que as ajudassem a descobrir seus próprios dons, isto é, descobrir os “presentes” que Deus teria dado a cada uma delas. Estes eram divididos em várias etapas, mais precisamente falando, em 6: 

  • O 1º Presente, ou Dom, introduzido a partir dos 12 meses, eram 6 bolas de lã coloridas que possuíam fios para pendurar e se encontravam dentro de caixas de madeira no formato de paralelepípedos. Este trabalhava a aprendizagem das cores, estruturação espacial, jogos de memória, conjunto, contagem, movimento, vocabulário e lateralização. 

  • O 2º era formado por uma caixa (paralelepípedo) que continha um suporte e neste se encontravam pendurados um cubo, um cilindro e uma esfera. Este, iniciado aos 2 anos, estimulava a compreensão do cilindro como uma união da esfera e do cubo, além de também trabalhar a contagem (de peças, lados, cantos), os conceitos de posição etc. 
         Segundo Miller e Lupton (2009, p.14) 




        Os Presentes de três a seis dividiam o cubo em geometrias menores e cada vez mais complexas, formando um vocabulário de elementos progressivamente precisos. Nos planos de Fröebel, esse vocabulário se tornaria rico e variado o suficiente para permitir à criança formar representações do mundo à sua volta. 



  • Composto por um cubo dividido em 8 partes dentro de uma caixa em formato também de cubo, o 3º presente era dado aos 3 anos e pretendia trabalhar conceitos de equilíbrio e ordem, a criatividade, noções básicas da matemática (operações, frações), linguagem e desenvolvimento de vocabulário. 



  • O 4º dom, para crianças de 4 anos, continha 8 paralelepípedos colocados dentro de uma caixa de madeira em formato de cubo. Este presente, assim como o 3º, desenvolvia muito bem conceitos de parte e todo, e trabalhava a criatividade e a aquisição de um novo vocabulário, além de estimular os mesmos conceitos e noções que o 3º, só que de maneira diferenciada. 


  • O presente 5, destinado as crianças de 5 anos, era uma caixa que possuía 27 pequenos cubos, porém 3 destes eram cortados em uma diagonal, formando 6 triângulos pequenos, e outros 3 em ambas as diagonais, formando 12 triângulos ainda menores. Ele estimulava equilíbrio e criatividade, lateralidade, noção espacial, raciocínio lógico, situações problemáticas e construções. Era aconselhado a partir dos 5 anos. 

  • O 6º presente era um cubo de 3 polegadas dividido em uma variedade de prismas retangulares e ajudava a continuar os conceitos dos 3 anteriores de forma mais complexa. Também aconselhado a partir dos 5 anos. 



        
        Após estes 6 presentes, ainda existia o 7º, destinado a crianças maiores de 6 anos, que promovia a passagem suave dos conceitos e noções dos sólidos geométricos para as superfícies independentes. Ele era formado por várias superfícies planas derivadas das faces dos sólidos anteriores (quadrados, triângulos equiláteros, retângulos e obtusos, isósceles e escalenos, círculos e semicírculos). Esse material ajudava a criança a entender a superfície como algo independente e auxiliava a desenvolver o pensamento abstrato a partir da infinitas combinações dos objetos concretos, desta forma a passagem não era tão brusca.

Ainda existem mais 4 dons que dão continuidade ao que se trabalhava no presente 7, porém estes foram inventados pelos seguidores de Fröebel após a sua morte. Eles se encontravam distribuídos da seguinte maneira: 

  • No presente número 8 ocorria a passagem do bidimensional (superfície) para o contorno (linha). Ele era constituído por pequenos bastões e formas curvas. Inicialmente as crianças deveriam brincar com as peças retas, logo após com as curvas, e finalmente unindo-se as duas. 

  • O 9º fazia a passagem da linha para o ponto. Neste dom, o nível de abstração seria mais complexo, pois tudo deveria ser formado através dos pontinhos coloridos disponibilizados no brinquedo. 

  • O 10º encerra a passagem do concreto para o abstrato. Este presente, constituído de vários bastões retos e esferas perfuradas (pontos) tinha o objetivo de fazer a criança construir a representação de planos e sólidos geométricos unindo ponto e linha. Tal material, assim como o 9º, deveria ser dado às crianças aos poucos, proporcionando um desenvolvimento gradual e não abrupto. 

  • O 11º são os presentes curvilíneos, constituído por formas curvas originadas de um cilindro “explodido”. 



 

 




        Os Presentes permitiam às crianças construir um mundo à sua própria maneira, representar tudo a sua volta da maneira que enxergavam, explorando todos os sólidos e planos geométricos e todas as oportunidades dadas a elas em forma de brinquedos. “As crianças sempre gostam de construir coisas do seu próprio mundo. A representação de tudo o que é familiar para eles é uma experiência maravilhosa.” (GOMARIZ, 2015). Todo esse material em conjunto ajudava a desenvolver uma criança muito mais criativa e de raciocínio aguçado. 

        Dando continuidade ao material deste educador, temos as Ocupações (desenho, colagem, recorte, pintura, bordados etc.). Todas as Ocupações desenvolvidas por Fröebel eram baseadas em quatro pilares fundamentais de educação: autorrealização (compreender as coisas práticas da vida seria muito mais educativo e formador do que simplesmente compreender a teoria.); finalidade (conseguir externar todas as potencialidades existentes dentro de uma criança através do trabalho livre, independente e disciplinado.); ambiente (a natureza deve fazer parte do processo de educação infantil, pois deve-se tentar desenvolver ao máximo a criança e sua integração na sociedade.); e atividades (desenvolver o intelecto da criança através de práticas que propiciem o trabalho do ritmo e da coordenação, assim como a valorização de histórias que treinam a criatividade e a imaginação.). 

        Os Presentes e Ocupações tinham regras para ser utilizados, assim garantindo o total aproveitamento pedagógico. As brincadeiras propostas por Fröebel às crianças, eram, quase sempre, ao ar livre para que houvesse a interação da turma com o ambiente. De acordo com Arce (2002), "todos os jogos que envolviam os dons começavam com as pessoas formando círculos, movendo-se e cantando, pois assim conseguiam atingir a perfeita unidade" (apud FERRARI, 2008). 

        Foi em seus Jardins de Infância que Fröebel melhor desenvolveu seus Presentes e Ocupações. Ele entendia que os jogos e as ocupações lúdicas fariam um melhor efeito no desenvolvimento da criança. Para Kishimoto (2000, p.64), ele, ao elaborar sua teoria, “percebe que o jogo resulta em benefícios intelectuais, morais e físicos e os elenca como elemento importante no desenvolvimento integral da criança”. 

        Fröebel tinha em mente que na primeira infância não deveriam ser colocados, na mente das crianças, assuntos “escolares” – estes ficariam no período propriamente escolar, a partir dos 6, 7 anos –, pois este seria o momento ideal de se trabalhar a percepção, o raciocínio e a aquisição de vocabulário. Como explicado anteriormente, ele tinha as brincadeiras como um meio de aprendizado, assim como de autoconhecimento da criança, através da exteriorização. Ademais através da observação, percebeu que os símbolos exerciam grande força nas crianças. Por este motivo, o criador do Jardim de Infância tinha a certeza de que nem os brinquedos nem as brincadeiras poderiam mais ser escolhidos ao acaso, estes deveriam ser trabalhados, estudados e analisados para que pudessem oferecer aos seus alunos as atividades mais adequadas, propiciando o máximo nível de seu desenvolvimento. E com a criação do Kidergarten e dos Presentes e Ocupações ele com certeza conseguiu concluir suas teorias. 




REFERÊNCIAS 


ARCE, Alessandra. Lina, uma criança exemplar! Friedrich Fröebel e a pedagogia dos jardins-de-infância. Rev. Bras. Educ., Universidade Estadual de Campinas, n. 20, p. 107-120, ago. 2002. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/rbedu/n20/n20a09.pdf>. Acesso em: 26 nov. 2018. 


Dons de Fröebel. Disponível em: <http://www.colegiopenasreal.pt/Content/Conteudos/50/503CA757808446838DACCB655D21BA52_ANE.pdf> Acesso em: 26 nov. 2018. 


FERRARI, Márcio. Friedrich Fröebel, o formador das crianças pequenas. 2008. Disponível em: <https://novaescola.org.br/conteudo/96/friedrich-froebel-o-formador-das-criancas-pequenas > Acesso em: 26 nov. 2018. 


GOMARIZ, Pili Monzón. Hasta 1805 no se introduce Heinrich. 2015. Disponível em: <http://mongom.blogspot.com/2015/04/hasta-1805-no-se-introduce-heinrich.html> Acesso em: 26 nov. 2018. 


JAISA EDUCATIVOS. Los regalos o dones de Fröebel. 2014. Disponível em: <http://jaisaeducativos.net/blog/los-regalos-o-dones-de-Fröebel/> Acesso em: 26 nov. 2018. 


KISHIMOTO, Tizuko Morchida; PINAZZA, Mônica Apezzato. Fröebel: uma pedagogia do brincar para infância. In: Pedagogia(s) da infância: dialogando com o passado construindo o futuro. Porto Alegre, Artmed, 2007. p. 37-61. Disponível em: <https://edisciplinas.usp.br/pluginfile.php/4387410/mod_resource/content/2/Froebel%20-20uma%20pedagogia%20do%20brincar%20na%20inf%C3%A2ncia.pdf> Acesso em: 26 nov. 2018. 


MILLER, J. Abbott. Os Presentes e Ocupações de Fröebel. In: LUPTON, Ellen; MILLER, J. Abbott. ABC da Bauhaus: a Bauhaus e a teoria do design. 1ª. ed. [S.l.]: Cosac Naify, 2009. p. 14. 


PORTAL EDUCAÇÃO. Brincar – O jogo e o desenvolvimento infantil na teoria da atividade. Disponível em: <https://www.portaleducacao.com.br/conteudo/artigos/idiomas/brincar-o-jogo-e-o-desenvolvimento-infantil-na-teoria-da-atividade/5756]> Acesso em: 26 nov. 2018. 


REVISTA PROSA VERSO E ARTE. Friedrich Fröebel, pedagogo alemão criador do jardim de infância. 2018. Disponível em: <https://www.revistaprosaversoearte.com/friedrich-Fröebel-pedagogo-alemao-criador-do-jardim-de-infancia/> Acesso em: 26 nov. 2018. 


WIKIPEDIA. Friedrich Fröebel. Disponível em: <https://pt.wikipedia.org/wiki/Friedrich_Fr%C3%B6bel> Acesso em: 26 nov. 2018. 


______. Heinrich Pestalozzi. Disponível em: <https://pt.wikipedia.org/wiki/Johann_Heinrich_Pestalozzi> Acesso em: 26 nov. 2018. 



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Texto desenvolvido por  Maria Clara dos Santos Costa sob a orientação do Prof. Dr. Rodrigo Boufleur, para a disciplina Introdução ao Estudo do Design. O texto colabora com o projeto de extensão “Blog Estudos sobre Design” (http://estudossobredesign.blogspot.com) - Universidade Federal do Rio Grande do Norte - Departamento de Artes - Bacharelado em Design - Novembro de 2018.

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